O refluxo vésico-ureteral (RVU) acontece quando a urina que está na bexiga flui de volta para os ureteres e, muitas vezes, de volta para os rins.
Normalmente a urina segue o seguinte caminho: é produzida pelos rins, vai para a pelve (logo na saída do rim) e vai para a bexiga por meio de um tubo chamado ureter, é armazenada na bexiga e em seguida, na micção, passa para a uretra atingindo o meio externo. No entanto, nas crianças com refluxo, a urina retorna da bexiga para o ureter, podendo chegar até os rins. É o que se chamamos de Refluxo (retorno da urina) Vésico (da bexiga)-Ureteral (para o ureter).
Mecanismo do Refluxo vésico-ureteral
Os ureteres entram na bexiga em um ângulo diagonal e têm um sistema especial de válvula de 1 via que normalmente impede que a urina flua de volta pelos ureteres na direção dos rins. Quando uma criança tem refluxo vesico-ureteral, o mecanismo que impede o refluxo da urina não funciona, permitindo que a urina reflua para os ureteres e pode até alcançar os rins. Esta condição é mais frequentemente diagnosticada na infância.
Fatores de risco para o refluxo vésico-ureteral
Existem muitas razões diferentes pelas quais uma criança pode desenvolver refluxo vesico-ureteral. Algumas das causas mais comuns incluem:
- Ter pais ou irmãos com RVU. Conhecido como Refluxo familiar. Irmãos ou irmãs de crianças com refluxo têm uma maior chance de também apresentarem refluxo. Isso ocorre em cerca de 35% dos irmãos. Como essas crianças também têm chance de contraírem infecção urinária e lesão renal, recomenda-se investigação do refluxo nas mesmas. Ainda não se sabe qual a causa do refluxo familiar e nenhum fator genético foi ainda determinado.
- Nascer com defeitos do tubo neural como espinha bífida
- Ter outras anormalidades do trato urinário, como válvulas uretrais posteriores, ureterocele ou duplicação de ureter
O que o RVU pode acarretar?
Uma criança com refluxo vesicoureteral corre o risco de desenvolver infecções renais recorrentes. Isso, com o tempo, pode causar danos e cicatrizes nos rins.
O refluxo está comprovadamente associado a um número aumentado de infecção urinária (infecções urinárias recorrentes).
Teoricamente como a infecção se inicia na bexiga, havendo refluxo para os rins, seria mais fácil da infecção atingir também o sistema renal, causando uma infecção mais grave, conhecida como pielonefrite. Portanto, diz-se que as crianças com refluxo têm uma chance maior de apresentarem infecção renal que as outras sem refluxo.
Essas infecções urinárias que atingem a unidade renal, leva à lesão renal, causando dano às células que compõem a unidade funcional dos rins, que são os néfrons.
Sendo assim, o objetivo maior do tratamento do refluxo é evitar a infecção de urina, na tentativa de se preservar a função renal.
Quais são os sintomas do refluxo vesico-ureteral?
A seguir estão os sintomas mais comuns de refluxo vesicoureteral. No entanto, cada criança pode apresentar sintomas de forma diferente.
Os sintomas podem incluir:
- Infecção do trato urinário. As infecções do trato urinário são incomuns em crianças com menos de 5 anos de idade. São improváveis em meninos em qualquer idade, a menos que o RVU esteja presente. Por isso toda infecção em lactentes deve ser investigada.
- Problemas com a micção, incluindo:
- Urgência e incontinência
- Manobas de contenção urinária
- Uma massa no estômago de um rim inchado
- Pouco ganho de peso
- Pressão alta
Os sintomas do RVU podem se parecer com outras condições ou problemas médicos. Sempre converse com o médico do seu filho para um diagnóstico.
Como é feito o diagnóstico de Refluxo vésico-ureteral?
O RVU muitas vezes pode ser encontrado por ultra-som antes do nascimento de uma criança.
Já toda criança que ainda não tem micção voluntária, ou seja, ainda não tem o treinamento miccional, com infecção urinária, mesmo no primeiro episódio, mesmo afebril, deve ser investigada para refluxo.
Aquelas com infecção urinária afebril, após o treinamento miccional não necessitam ser investigadas para refluxo.
Os procedimentos de diagnóstico para RVU podem incluir:
- Cistouretrograma miccional (CUM). A investigação para refluxo se faz com CUM. Um CUM é um raio-X específico que examina o trato urinário. Esse exame é extremamente importante e não deve deixar de ser realizado. Passa-se uma sonda até a bexiga, por onde será administrado o contraste iodado para encher a bexiga. As imagens de raios-X serão tomadas à medida que a bexiga enche e esvazia. Algumas radiografias são obtidas, as quais avaliarão se há retorno de urina para os ureteres e rins. As imagens mostrarão se há algum fluxo reverso de urina para os ureteres e rins. Caso haja refluxo, normalmente as crianças são seguidas com cistouretrografia radioisotópica anual ou a cada 2 anos.
- Ultrassonografia renal. Este é um teste não invasivo no qual um transdutor é passado sobre o rim. Ele produz ondas sonoras que rebatem no rim e transmitem uma imagem do órgão em uma tela de vídeo. O teste é usado para determinar o tamanho e a forma do rim e para encontrar uma massa, pedra nos rins, cisto ou outra obstrução ou anormalidade.
- Exames de sangue.
Qual é o tratamento para o refluxo vésico-ureteral?
O RVU pode ocorrer em vários graus de gravidade. Pode causar refluxo leve, quando a urina retorna apenas a uma curta distância nos ureteres. Ou pode causar refluxo grave, levando a infecções renais e danos permanentes nos rins. O tratamento específico para RVU será decidido pelo médico do seu filho com base em:
- A idade do seu filho, saúde geral e histórico médico.
- A extensão da condição.
- A tolerância do seu filho a medicamentos, procedimentos ou terapias específicas.
- Expectativas para o curso da condição.
- Sua opinião ou preferência.
O médico do seu filho pode atribuir um sistema de classificação (variando de 1 a 5) para indicar o grau de refluxo que seu filho tem. Quanto maior o grau, mais grave o refluxo.
Classificação do refluxo vésico-ureteral
Essa é a classificação do refluxo, em 5 graus, de acordo com o cistouretrografia:
- Grau 1– refluxo de urina até o ureter.
- Grau 2– refluxo de urina até o rim, mas sem dilatação do ureter e da pelve (sistema que está conectado ao rim.
- Grau 3– refluxo de urina até o rim, com dilatação do ureter e pelve.
- Grau 4– refluxo de urina até o rim com dilatação acentuada do ureter e pelve.
- Grau 5– refluxo de urina até o rim com dilatação tão acentuada do ureter, que esse faz dobras até chegar na pelve.
Em geral o tratamento inicial é clínico. Excluem-se os casos de refluxo em idades avançadas, principalmente no sexo feminino, refluxos de alto grau e bilaterais em crianças maiores, existência de infecção urinária de repetição apesar do uso de antibióticos, difícil seguimento clínico da criança, uso irregular da medicação antibiótica, evidência de aumento de lesão renal com o seguimento clínico.
A maioria das crianças com RVU de grau 1 a 3 não precisa de nenhum tipo de terapia intensa. O refluxo se resolve sozinho ao longo do tempo, geralmente dentro de 5 anos.
O tratamento clínico consiste de observação cuidadosa da criança e uso de antibióticos profiláticos, que consiste na utilização de antimicrobianos em baixas dosagens com a finalidade de prevenir infecções. Os antibióticos ideais são aqueles com amplo espectro de ação contra as bactérias que comumente atingem o sistema urinário, e aqueles com excreção renal, já que aqueles com excreção fecal, podem selecionar a flora bacteriana fecal e promover infecções urinárias multi-resistentes. Uma medicação que preenche esses requisitos é a nitrofurantoína (Hantina) 2 mg/kg/dia, dose única.
O refluxo diagnosticado no primeiro de vida tende a se resolver espontaneamente mesmo se for bilateral e de alto grau.
Não há motivo para preocupação em relação à antibiotiterapia profilática.
A dose de antibiótico é muito pequena e não há riscos com seu uso. Há sim benefício porque comprovadamente protege seu filho de infecções.
As crianças com refluxo moderado e grave (grau 3 ou maior) ou que desenvolvem febres ou infecções frequentes podem precisar de antibioticoterapia preventiva contínua e exames periódicos de urina. O tratamento cirúrgico também está disponível.
Crianças com refluxo grau 4 e 5 podem precisar de cirurgia. Durante o procedimento, o cirurgião criará um aparelho de válvula de aba para o ureter que impedirá o fluxo reverso de urina para o rim. Em casos mais graves, o rim e o ureter cicatrizados podem precisar ser removidos cirurgicamente.
Como é a cirurgia anti-refluxo?
A cirurgia aberta atualmente é normalmente realizada após a falha da injeção endoscópica. A cirurgia anti-refluxo tem a finalidade de corrigir o defeito na junção entre o ureter e a bexiga, que é a responsável pelo problema. Há várias técnicas para esse fim e nenhuma é verdadeiramente superior a outra. Portanto a diferença da técnica utilizada será a preferida do cirurgião. A cirurgia é realizada por meio de uma incisão esteticamente aceitável (para as meninas e meninos, a cicatriz fica para dentro da marca do biquíni e da sunga). A criança fica com uma sonda na bexiga por 1 a 3 dias. A taxa de cura deste procedimento é de 97%.
Outra alternativa que pode ser utilizada como primeira escolha ou quando há indicação cirúrgica é a injeção endoscópica. Este procedimento é realizado em regime ambulatorial, ou seja, a criança tem alta hospitalar no mesmo dia do procedimento e tem uma taxa de cura de 70 a 90% nos refluxos de grau I a III e de cerca de 50% nos refluxos graus IV-V.
O que é a injeção endoscópica para o refluxo vésico-ureteral?
A injeção periureteral é um tratamento minimamente invasivo do refluxo vesicoureteral. Consiste numa injeção de substâncias próximo ao orifício ureteral na bexiga com a finalidade de impedir o retorno de urina para os ureteres. Esse procedimento é feito sem incisão cirúrgica, sendo utilizado apenas aparelho endoscópico.
Mas o refluxo pode resolve espontaneamente?
Sim, pode. Depende de alguns fatores, como:
- Grau- Quanto maior o grau, menor é a chance de se resolver espontaneamente.
- Lateralidade- Os refluxos graus 3,4 e 5 unilaterais apresentam uma chance de resolução espontânea maior do que aqueles bilaterais.
- Presença de disfunção vésico-uretral associada- a disfunção miccional se associa a refluxo em torno de 30% dos casos. Quando ela é tratada, a taxa de resolução espontânea é 3 vezes maior do que aquelas sem disfunção.
- Idade- Quanto maior a idade da criança na época do diagnóstico, menor é a taxa de resolução espontânea. A chance de resolução do refluxo após os 6 anos de idade é pequena.
Conclusão sobre o refluxo vésico-ureteral
Como vimos, o refluxo é uma condição que demanda um acompanhamento periódico com o médico especialista (Uropediatra), que será bastante criterioso quanto ao tratamento mais adequado para cada caso.